Tambores de Xangô


Novembro de Todas as Cores

Rachel Rocha
(É professora de Antropologia
e pesquisadora da cultura afro-alagoana)

Maceió decide mostrar sua face negra em grande estilo. Subsumidas por séculos de preconceito racial e cultural - quando se trata das manifestações negras - comunidades representantes dessa rica tradição alagoana realizam nos dias 18 e 19 de novembro, no emblemático bairro de Jaraguá, uma grande comemoração numa clara demonstração de altivez e de reverência a uma tradição que é responsável pelo legado cultural presente em muitas das referências locais. O evento é uma realização da rede Articulação pela Cultura Popular e Afro-Alagoana e conta com o apoio do BNB e da Secretaria de Estado da Cultura de Alagoas.

A ideia, que partiu da comunidade negra Filhos de Axé Sociedade Afro-Cultura Palácio de Airá, que tem à frente o líder religioso babalorixá Elias de Airá, realizará no dia 18/11 (próxima sexta-feira), a cerimônia de coroação do Rei Doté Elias e da Rainha Lucineide, do Maracatu de Nação A Corte de Airá. A solenidade está marcada para as 9h00 na igreja Nossa Senhora Mãe do Povo, em Jaraguá.

A escolha não poderia ter sido mais feliz, uma vez que nesse mesmo bairro, na rua atrás da referida igreja, estava localizado um dos mais afamados terreiros de Maceió no começo do século XX, o de Mestre Felix, destruído, como muitos outros, em fevereiro de 1912, no episódio que ficou conhecido como “Quebra quebra dos terreiros” e que pôs fim a esta e a outras dezenas de casas religiosas afro-brasileiras na capital e no interior de Alagoas.

A brutal ação, demonstração da intolerância para com as práticas religiosas afro-brasileiras na Maceió provinciana de há um século, trouxe serias consequências à vivência e à visibilidade da religiosidade de matriz negra, resultando, entre outras, no que alguns, como Gonçalves Fernandes (Sincretismo Religioso no Brasil, 1941), identificou como uma nova modalidade de culto, batizado então de “xangô rezado baixo” que, na prática, refletia a intimidação de um candomblé que passava a ser realizado não mais com atabaques, mas com palmas.

Para relembrar e denunciar práticas intimidatórias contra os afro-brasileiros, ainda hoje presentes na Maceió contemporânea, as comemorações continuam no dia 19/11 (sábado), na praça Dois Leões (Jaraguá), com a realização de outra cerimônia, esta batizada de “Tambores de Xangô Rezado Baixo” que, desta feita, rezarão alto e em bom som, proclamando a necessária liberdade de cultos oriundos de negros escravizados e que se constituem em referências fundantes da cultura alagoana.

Essas manifestações, de rara beleza, solidariedade e sabedoria são motivo de orgulho para todos os alagoanos que terão a oportunidade de assistir a várias apresentações de maracatus, manifestações que existiam na Maceió do século XIX e começo do século XX e que depois desapareceram por conta do preconceito, mas que agora retornam, como indica a programação abaixo:


18h00 –abertura com as autoridades;
18h30 – cerimônia “Tambores de Xangô Rezado Baixo”, part. de yalorixás de Alagoas;
19h00- Maracatu Mirim  (Ponto de Cultura AMAJAR)
19h30- Maracatu Baque Alagoano;
20h00- Maracatu Raiz da Tradição;
20h30-Afoxé Oju Omin Omorewá;
21h00- Arê Iorubá (Núcleo Cultural da Zona Sul);
21h30- Maracatu Coroa Imperial;
22h00 – Malungos do Ilê;
22h30 – Maracatu Axé Zumbi  (Núcleo Cultural da Zona Sul);
23h00 – Maracatu Nação A Corte de Airá;
23h30 – Encerramento com Coletivo AfroCaeté.
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