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O último trupé de Mestra Hilda - Keyler Simões



Coco alagoano perde uma de suas maiores representantes


A cultura popular de Alagoas sofreu mais um baque nesta manhã, com a morte de Hilda Maria da Silva, a Mestra Hilda, a dama do Coco de Alagoas, uma das mais carismáticas e queridas mestras populares e uma das últimas detentoras do saber do coco de Alagoas, também chamado de Pagode.

Fibra é a palavra que define os fortes. Perseverança, define os destemidos. Coragem, é a palavra que define os heróis. Dona Hilda é sinônimo de todas elas. Com 89 anos de idade, completados em 1º de julho último, Mestra Hilda era uma das maiores figuras do nosso folclore e nossa cultura em geral.

Faleceu na manhã desta terça, por ironia, ainda no mês do folclore... sua vida.

Nascida e criada em Rio Largo, bem próximo à Maceió, essa senhora trabalhou muito em diversas tecelagens de Maceió para sobreviver. Vinda de família muito humilde, recebeu dos pais a influência de dançar o Pagode. Sempre que havia uma reunião de amigos, lá estava Hilda dançando e cantando o nosso pagode, mais conhecido por Coco. O que começou como uma brincadeira de criança, transformou-se em uma das mais autênticas representações do povo alagoano.


Naquela época nem se falava em manter vivas as nossas tradições. Dançava-se por puro prazer. Como o prazer que Dona Hilda ainda tem ao subir num palco e apresentar-se para um público, como ela própria diz: “Gosto de me apresentar... de ver aquele povo todo me aplaudir... Eu fico, que é uma coisa.! Se eu tiver com alguma dor ruim... melhoro rapidinho. É como uma coisa que sai do coração, que me deixa tremendo toda de felicidade...”.
Hilda da Silva, completou neste ano 46 anos de cantoria à frente de grupos de pagode e de Baianas. “Fui criada assim. Sempre que tinha uma festa, eu ia com os meus pais ou com meus amigos”, lembra Dona Hilda. Foi assim, não ao acaso, que ela conheceu e se apaixonou pelo seu marido, aos 25 anos de idade. Foram mais de 50 anos de casamento, quando em 1999 ele faleceu. Tristeza só superada pela dedicação e o prazer com seus grupos.

Quando perguntada sobre o que gosta mais, entre o Pagode e as Baianas, Dona Hilda não demorava a responder: “Gosto mais do Pagode porque é mais quente, tem um fogo... que eu gosto muito, que faz um bem danado”. Seu grupo de Pagode é, sem dúvida, o mais conhecido e o que leva no nome a força dessa senhora: Pagode Comigo Ninguém Pode, a quem ela se dedicava de corpo e alma, pois a danada não só canta e compõe, como também compra e enfeita as roupas dos “dançadores”, são 13 pessoas no total e mais 3 para entrar. Ela dizia: “Eu compro as roupas dos homens e das mulheres, que elas mesmas é que costuram”. E não fica só por aí, não. Além disso, é ela quem lava as roupas, após cada apresentação, e guarda em casa. “Quando tem uma apresentação, o pessoal passa lá em casa pra pegar as roupas, e quando acaba tem que deixar lá. Eu lavo depois com muito cuidado pra não estragar, porque senão as roupas vão se acabando muito rápido e fica feio se apresentar tudo desbotado ou rasgado. Comigo não tem isso, não... tenho dois armários: um pro Pagode e outro pra Baianas”, explicou.



“Tem paciência morena, que eu mesmo serei teu bem....”



Esse cuidado não era à toa. Ela comprava as roupas dos grupos com o dinheiro que recebe da aposentadoria e da pensão deixada pelo marido. Além disso, fazia questão que todo mundo se apresentasse “cheirosinho” e bem arrumado, como ela própria faz questão de estar. Até meninas que viviam nas ruas Dona Hilda trouxe para dançar nos seus grupos e que se mantém lá. “Só não faço mais, porque parece que a nossa cultura tá se acabando, tá querendo cair, porque não dão valor. Tem muito ‘dançador’ que não quer mais se apresentar, porque o que pagam a gente, além de muito pouco, as pessoas demoram para pagar...”

Na época perguntamos à Mestra Hilda quem seriam seus aprendizes, e ela responde: “As minhas filhas, que dançam mais a Baiana, mas sabem tudo do Pagode, e a minha nora, Duarte, que canta comigo”.

Como todos os grandes mestres dos folguedos alagoanos, Dona Hilda conviveu muito com o falecido professor Pedro Teixeira (nosso homenageado), “Pedro Teixeira foi quem me apoiou e quem me dizia: ‘Dona Hilda a senhora é maravilhosa porque a senhora sabe o que está fazendo’. Pois o meu Pagode é autêntico, sem misturar com outras coisas. Ele me apresentava nos locais... Pedro Teixeira foi a maior pessoa que me considerou”

Dona Hilda era assim: simples, durona, exigente, responsável, e acima de tudo, uma figura simpática que representava uma grande parcela da nossa cultura... “Sei guerreiro... chegança... já dancei tudo isso., mas a memória não me ajuda mais”, e modesta, tanto é que quando perguntada sobre seu maior sonho ela respondeu: “Meu maior sonho é o meu Pagode. Essa é a minha ‘brincadeira’... é tudo para mim... é o que me deixa feliz”.


 
Dona Hilda Maria da Silva, tinha 89 anos de idade. Deixou 8 filhos (4 homens e 4 mulheres), mais de 30 netos, 16 bisnetos e 8 tataranetos. Seu filho mais velho é Natanael, de 72 anos. Da família, participavam do grupo Pagode Comigo Ninguém Pode: 03 filhas, 01 sobrinha e 05 netos. "Segundo Josefina Novaes, Presidente da Associação dos Folguedos Populares de Alagoas (ASFOPAL): "Dona Hilda era muito querida e é uma das maiores perdas da cultura popular de Alagoas, sem dúvida alguma".

Para Jurandir Bozo, músico, que hoje lidera o recém-fundado Clube do Coco, em Alagoas:"A energia que ela tinha era invejável... a cultura popular corria nas veias de Mestra Hilda... estamos tristes pois era uma grande referência".

O Coco está de luto, mas Alagoas deve muito a ela e só temos a agradecer por sua dedicação à cultura alagoana.



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